Receita para esticar uma manhã de sábado




Vinha andando devagarinho, equilibrando nas mãos juntas um tesouro gigantesco. Me mostrou com o rosto iluminado. ‘olha!’. Olhei. ‘O que é isso?’, quis saber. ‘É o tempo.’, respondeu. ‘O tempo? Onde o encontrou?’, perguntei. ‘Tirei da ampulheta. Estava sempre caindo, caindo...",  ele disse, e eu completei: “Um desperdício, não é?”. ‘É. Já reparou como é fininho?’. E penetrou o olhar na areia. Ela refletia o sol e brilhava. ‘Posso tocar?’. ‘Pode.’. Era tão fino que parecia entrar-me pelo dedo. ‘Rápido, vamos guardar para não se perder! Não se pode perder tempo, sabe?’, me incitou. ‘Sim, é verdade, não se pode mesmo. Onde o vamos guardar?’. ‘No relógio, não é lá que o tempo mora?’ E antes que eu dissesse alguma coisa, atirou a areia da ampulheta para dentro do velho cuco. ‘Acho que assim o dia vai ficar maior.’, justificou. Deu certo. Com tanto tempo enganchado nas engrenagens, aquela manhã de sábado durou o fim de semana inteiro.

2 comentários:

Paulo Vitor Cruz, ele mesmo disse...

há momentos q duram uma vida toda. foi assim qdo vi o meu amor chegar na rodoviária e a abracei. aquele momento é único.

*encantamento puro, passarinha... ponto p vc

besos.

Marcelo Soriano disse...

Um dos textos mais geniais que tive o privilégio de ler nos últimos tempos.